sábado, 2 de janeiro de 2016

“É necessário se espantar, se indignar e se contagiar; só assim é possível mudar a realidade.”
Faz muito tempo que as palavras de Nise ressoam no meu recorte de mundo. Com ela, aprendi que aquilo que chamo de realidade é uma trama – um amarrado de fiapos daqui e dali, do ontem e do amanhã, uma tapeçaria na qual meu olho finge que acredita. Nem sempre o desenho me apraz, mas quando vem o desgosto a indignação é o remédio, como a Nise diz. Navegar contra a corrente, perseverante.

Em dias de indignação com o presente, olho para o futuro. Já fiz desse hábito meu ofício. Um dia, troquei o ofício pelo sacrifício, num gesto deliberado de compromisso com o mensurável – mas pretendi, nesse gesto, um fazer sagrado, como todos os sacrifícios deveriam ser. Hoje, olhar para o futuro é meu sacrifício indignado.

Três quartos de volta de Saturno depois, tudo faz sentido. Ainda me encanta a polifonia das estrelas – mas quando olho para o futuro, vejo um único caminho possível: o do afeto. Amigos olham junto, sentamos em multidões de indignados, comungando em sagrados ofícios, o afeto se estende além-muros, além-fronteiras, além-mar, além-órbitas. O mapa do futuro está sendo rabiscado em margens.

Esta semana toda, Dra. Nise é homenageada na FLUPP. Contagiemo-nos. Que possamos nos reinventar com os poetas nas condições raras que o navegar contra a corrente exige, nas palavras da Nise: espírito de aventura, coragem perseverança e paixão.